tudo perdido, o corpo cansado, o colapso, as expectativas grandes, e tudo que se quer é um abraço de qualquer pessoa do mundo, as músicas e os filmes e os comerciais de margarina só te fazem chorar, e o travesseiro te faz chorar, e o olhar do gato te faz chorar, e as pessoas te fazem chorar, e o mundo te abraça e você não agüenta de falta de ar, e o mundo te judia, e uma frase solta de um quase-refrão em um carro qualquer te mareja os olhos, e mareja o estômago, e alguém que te lembra outro alguém em algum lugar e te lembra uma situação específica, e essa situação era tudo que você queria, e esse alguém te lembra tanto e ao mesmo tempo significa tão pouco e tanto, e esse alguém te lembra tudo que você foi e ficou pra trás, e você fica feliz, e você não agüenta mais, e então esse alguém aleatório te abre as portas da sensibilidade de novo, e você chora sem saber por que, mas sabendo sim, que é por tudo que nunca mais vai existir, mas que já esteve tão presente e tão palpável, era uma coisa tão palpável que inundava tudo, mesmo só existindo em um lugar específico e nem sendo real, só que isso te pega pelas entranhas e você se pega pensando em como kerouac estava certo quando dizia que toda escrita deveria ser instantânea, mesmo com o tanto de clichês que isso acarreta, porque esse monte de clichês é tudo que nós somos e que nos foi ensinado desde que éramos crianças e não tínhamos noção de nada dessa vida e que nunca nem suspeitávamos que um travesseiro nos faria chorar ou muito menos que um dia nós deitaríamos em um chão frio ouvindo uma só música no repete e em todo refrão você choraria, não por causa da letra, mas porque ela te passa tantas emoções com apenas um ‘ooooh’, e você sabe que essa escrita sem pontos e nem parágrafos é o maior clichê que poderia existir, só que de uma forma ou de outra é apenas tudo o que você sabe fazer, pois as coisas vem chegando e não há tempo para pontos e parágrafos e muito menos para estruturações e escolher palavras para não repetir, e nem para sinônimos e nem para quase nada do mundo, para quase nada do mundo há tempo, há tempo, sim, para tudo que não precisa e não tem razão de ser, mas você escolhe usar esse tempo para se lembrar e sofrer, e ouvir músicas deitado no chão do quarto, quando tudo o que você queria mesmo era sair por aí à noite sozinho, talvez ouvindo a música em algum fone de ouvido, ou na cabeça, ou ao longe em alguma festa qualquer, mas tudo que acontece é ficar parado, parado, e lá se vai mais um dia, e você não viu as pessoas que queria ver, mesmo as que você não conhecia e que cruzaria, por acaso, em alguma esquina, ou sentaria do lado no ônibus, e quem sabe essa pessoa estaria usando o seu tempo também para lembrar e sofrer, e talvez você olhasse para os seus olhos e por uma fração de segundos haveria uma lágrima, mas você não perceberia, porque você nunca encara as pessoas na rua ou em ônibus, pode ser constrangedor por algum motivo qualquer, e essa pessoa não choraria em lugares públicos, porque pode ser constrangedor por algum motivo qualquer, mas e se não fosse, e se você visse, e se houvesse coragem, e se as mãos se tocassem, por um segundo que seja, seria um segundo que valeria uma vida, mas não existe, só existem pessoas que se parecem com outras e te lembram alguma coisa e te fazem chorar pelo simples fato de não existirem mais, e aí tudo se perde
e então vem a vida e te abraça mais uma vez.