22 junho, 2009

Balada

Sangrar-me inteira, não de doer mas de felicidade, para me doar inteira, retirar cada pequena coisa que me compõe, todos os pequenos cantinhos do meu ser, puxar as veias, as artérias, tirar cuidadosamente cada fio de cabelo, e até cada uma das unhas, que tanto me angustiam, remexer as tripas, vazar as lágrimas, a saliva e o suor, bem como todos o ácido do estômago, junto com seus antiácidos e os remédios pra dormir e as pílulas para parar de sangrar (parar de tomá-las). Arregaçar todas as fraturas expostas e também as da minha alma, todos os pequenos momentos em que eu sabia que estava feliz e os outros em que quis morrer, quando senti pena de mim e quando tive saudades. Melhor: todas as vezes em que estive tranquila. Todo o meu desespero, meus impulsos, meu querer maior do mundo, tudo que me assusta e me faz puxar a coberta na hora de dormir, tudo que eu mais amo. Meus arranhões nostálgicos no joelho e minhas mãos rabiscadas, meus olhos ruins, minhas ideias cansadas, meu eterno medo e minha admiração por tudo que tem qualquer coisa de vivo. Toda a minha ternura, minhas coisas boas, meu sorriso, aquilo que se sente quando vê o mar, meu sono, meus sonhos... Empilhar com carinho todas as partes à sua frente e fitá-la por um ou dois segundos antes de eu, essência, me juntar a ela. Tudo quanto sou ou já fui, tudo que poderia ter sido mas não, o que vou ser, tudo embalado em fita amarela, pra te entregar.

12 junho, 2009

tudo tão bom, tudo tão bom, tudo tão bom

o contorno dos prédios ao amanhecer preenche os olhos. o barulho dos pássaros brincando dá naturalidade ao concreto. é tudo tão coeso e tão bom que sinto até um agradável aroma que recorda os tempos de infância. talvez sopa. é isso. sopa da vovó, com legumes. e tudo se completa com essa melodia. uma sinfonia completa. bravo!

gostaria que tudo isso estivesse lá quando o dia amanhecesse. e um desesperado ato diz para me manter ativo, mas as forças físicas me forçam de tal maneira que não resisto.

e acordo, e lá está o prédio. lá estão os trabalhadores. lá estão os pássaros, as nuvens, a vovó cozinhando na janela e o vizinho a treinar violão. tudo uma plena sinfonia, desesperada para ser ouvida.

por pupo, em um dia especial

07 junho, 2009

passado no céu

conversávamos hoje sobre uma ideia do barthes, que diz fotografia é a imortalização de um momento impossível. porque quando você tira uma foto para eternizar alguma cena, você não está vivendo a tal cena. você está fotografando. e aquilo que fica no papel é apenas uma fração de instante que nunca, nunca mais vai existir de novo, só foi real por pouquíssimo tempo. é como olhar para o céu e ver as estrelas que já morreram ou então para uma árvore que ainda conserva as folhas secas: é ver o passado.

ah, eu sou só um grande coração, deixa pra lá.