os anjos batem na janela do quarto, pedindo para entrar. cada batida é mais choro para a menina lá dentro. um deles, o mais esperto e bonito, passa por debaixo da porta.
-- a morte não é nada mais que a ausência da vida.
-- então a vida seria a ausência da morte, e não é assim. a gente vive para ver morrer.
-- a vida é a morte, ela está aí todos os dias, em todas as coisas. olhe para o céu: as estrelas são fantasmas. cada segundo que passa é um momento morto. você já pensou que o futuro vira passado assim que você termina de pronunciar a palavra?
-- eu sei. futuro-passado-futuro-passado-futuro-passado, é um ciclo que não acaba nunca. ou melhor, acaba sim.
-- tudo se resume a uma coisa só, que não é o presente, já que ele não existe. é uma coisa que não tem nome, mas é isso que a gente vive.
-- antes eu achava que o tempo era vida, agora penso que é morte.
18 agosto, 2008
'escrevo versos como tem fome', digo, 'e como quem tem fome, me alimento do nada'. aquele não-ser que preenche tudo, as noites vazias, os domingos, que é o que eu sou e os outros também. 'escrevo versos como quem tem fome', e nem sei mas de onde tirei isso. escrevo versos como quem nasce ou morre, e como nada.
e o nada cresce, cresce tanto que ocupa tudo, e quando vejo tem aquele abismo me olhando, e ele vai crescendo também, logo está maior que eu, dá medo de ver, é bom piscar bastante, porque parece que ele diz seu nome, e ele está ali, só esperando um descuido.
faço versos como quem morre, e a morte é isso, é o nada. é por isso que bota medo na gente, e é por isso que os poetas são todos meio loucos; o nada assusta, move e preenche. aqueles versos todos sem rimas, que nem falam de amor, só de vida. eu como o nada. faço os versos para me alimentar de tédio.
cuspo fora todo o prazer, que é assim que me ensinaram. fujo pela tangente que é aquela porta aberta, mas sei que vou voltar;
(há um encanto nesses dias e noites tão vazios que dá até para tocar);
penso em mim e nos outros; o encanto contagia tudo: o quarto, a cama, o relógio que parece lua, as crianças que pedem uma moedinha para ajudar, os padres e os peixes, a seção de cosméticos no mercado, até a mim,
e eu escrevendo e escrevendo sem parar, escrevo só para ver o nada virando real.
e o nada cresce, cresce tanto que ocupa tudo, e quando vejo tem aquele abismo me olhando, e ele vai crescendo também, logo está maior que eu, dá medo de ver, é bom piscar bastante, porque parece que ele diz seu nome, e ele está ali, só esperando um descuido.
faço versos como quem morre, e a morte é isso, é o nada. é por isso que bota medo na gente, e é por isso que os poetas são todos meio loucos; o nada assusta, move e preenche. aqueles versos todos sem rimas, que nem falam de amor, só de vida. eu como o nada. faço os versos para me alimentar de tédio.
cuspo fora todo o prazer, que é assim que me ensinaram. fujo pela tangente que é aquela porta aberta, mas sei que vou voltar;
(há um encanto nesses dias e noites tão vazios que dá até para tocar);
penso em mim e nos outros; o encanto contagia tudo: o quarto, a cama, o relógio que parece lua, as crianças que pedem uma moedinha para ajudar, os padres e os peixes, a seção de cosméticos no mercado, até a mim,
e eu escrevendo e escrevendo sem parar, escrevo só para ver o nada virando real.
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