'escrevo versos como tem fome', digo, 'e como quem tem fome, me alimento do nada'. aquele não-ser que preenche tudo, as noites vazias, os domingos, que é o que eu sou e os outros também. 'escrevo versos como quem tem fome', e nem sei mas de onde tirei isso. escrevo versos como quem nasce ou morre, e como nada.
e o nada cresce, cresce tanto que ocupa tudo, e quando vejo tem aquele abismo me olhando, e ele vai crescendo também, logo está maior que eu, dá medo de ver, é bom piscar bastante, porque parece que ele diz seu nome, e ele está ali, só esperando um descuido.
faço versos como quem morre, e a morte é isso, é o nada. é por isso que bota medo na gente, e é por isso que os poetas são todos meio loucos; o nada assusta, move e preenche. aqueles versos todos sem rimas, que nem falam de amor, só de vida. eu como o nada. faço os versos para me alimentar de tédio.
cuspo fora todo o prazer, que é assim que me ensinaram. fujo pela tangente que é aquela porta aberta, mas sei que vou voltar;
(há um encanto nesses dias e noites tão vazios que dá até para tocar);
penso em mim e nos outros; o encanto contagia tudo: o quarto, a cama, o relógio que parece lua, as crianças que pedem uma moedinha para ajudar, os padres e os peixes, a seção de cosméticos no mercado, até a mim,
e eu escrevendo e escrevendo sem parar, escrevo só para ver o nada virando real.
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