06 fevereiro, 2009

Doer

As feridas vão se abrindo ao contrário do desabrochar das flores; é algo mais corrosivo, incômodo, dá ânsia, angústia. Vão crescendo como galhos pontudos, sem direção, para todos os lados, crescendo finos, crescendo tortos, ocupando espaço, alcançando o céu. Sem folhas, só galhos. Assim vão se abrindo os buracos, carregados de botões de nada (que o nada é o que mais fere, que o tédio machuca mais que uma punhalada). E o medo, o medo de que um dia essa fome de vida acabe, que não exista mais tanto interesse por tudo quanto há no mundo que chega até a doer no peito.

Será que todas essas pessoas que a gente vê na rua ou no ônibus vivem tanto assim? Sabem, viver tanto que chega até a dar vontade de morrer? Elas vivem, certo. Mas será que choram, se dóem, e riem, e sofrem, e correm, e amam amam amam, e não dormem nunca, nem por um segundo, e quando dormem têm sonhos intranqüilos, e se angustiam, e se maravilham, e dão abraços, e se emocionam com uma nadica de coisa, e caem caem caem, e têm pequenas vitórias, e têm pequenos enormes prazeres, e falam falam falam, e ficam quietas, e querem morrer, e querer arder, e querem viver, viver!, e querem não sair da cama, e não se reconhecem no espelho, e imaginam tudo que poderiam ter sido, e sofrem até o peito não agüentar mais, e têm saudades, e bebem, e fumam, e se estragam, se acabam, se queimam queimam queimam até não sobrar quase nada, e têm raiva, e se contradizem, e querem mudar tudo, e ai! que preguiça, e pulam da cama, e escrevem freneticamente na madrugada de um domingo para segunda, poucos minutos antes de amanhecer, mas só querem escrever, soltar tudo, sangrar tudo, mesmo que seja um texto assim medíocre como esse, mas que carregue todo o peso do seu sangue, dos seus sonhos, de tudo que perderam e que amaram, de tudo o que suaram?

Meu ser, minha alma, minha lama.

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