01 outubro, 2008

Laika

Para ler ouvindo Laika, do Arcade Fire:

Quando a aeronave de Laika pousou suavemente no mar, seu banco se ejetou. Era perto da praia, então nadou até a areia. Sacudiu o sal, cheirou tudo ao redor. Não sabia onde estava, mas era feliz por ter voltado.

Começou a caminhar pela areia. Grossa, preta, com grandes pedras cor de terra escura, bem puxado pro tom de tijolos. Pulava de uma pedra para o chão, e depois outra, outra e outra, em um ziguezague sem fim. O céu era vermelho, cor de vinho. As nuvens, rosas, dançavam frenéticamente com a força do vento. Estava frio. Ia anoitecer.

Laika queria muito encontrar alguém. Sabia que, quando a vissem, iriam se lembrar de seu grande feito - afinal, fora a grande desbravadora do espaço sideral. Sua caudinha balançava suavemente, pois estava tremendamente orgulhosa de sua aventura bem-sucedida.

A noite chegara tão rápido como quando o foguete saiu rasgando da base. O vermelho tornou-se roxo, bem escuro. Ela caminhava sem parar, mas não encontrava viva alma. Chegou ao que parecia ser uma cidade fantasma. Os prédios eram altíssimos e realmente assustadores. Muita coisa havia mudado desde que partira ao infinito: nada lembrava seu antigo lar, nem de longe. Além das ruas vazias, o clima era pesado e havia um cheiro muito forte de podridão.

Todos estavam mortos. Todos. Não havia árvores, pessoas e nem outros cachorros. Só alguns ratos bem pretos e oleosos, que a olhavam de longe, soltavam um grito esganiçado e se entocavam novamente.

Seu passo vagarosamente perdeu o vigor.

Então percebeu o que fez as coisas mudarem: o tempo havia passado. Ela retornou exatos 234 anos depois de sua partida. E era como se estivesse se ausentado por apenas alguns dias; seu pêlo ainda era bonito e brilhante, seus olhos eram vivos, seu jeito de cachorra era como o de antigamente, quando ainda buscava bolinhas atiradas. O tempo não passara para ela, mas tinha sido absolutamente cruel com todas as outras coisas do mundo. O apocalipse havia acontecido debaixo de suas patinhas e ela não tomara conhecimento.

Laika estava sozinha no mundo.

2 comentários:

carla cursino disse...

Eu li ouvindo essa música, hehe!
Lembrei de um livro que li quando tinha uns 11 anos chamado "Sozinha no mundo".

Yuri A. disse...

Até poderia ser assim, mas a Laika foi para a caixa de brita logo que foi mandada em órbita. Sei que esses comunas não comem criancinhas de fato, mas nada disseram a respeito de fazer maldade com animaizinhos. Agora, é interessante imaginar como é a morte por estresse. Não deve ser algo muito agradável. Acho que você poderia escrever um texto da Laika no céu servindo de cão de guarda de são pedro e botando os cientistas russos falecidos pra correr.
:D